Liga Americana Explica: NFL Draft
Entenda a ordem das escolhas, critérios, trocas e o que define o destino dos principais talentos universitários.

"Liga Americana Explica" é uma série que apresenta, de forma clara, como funciona a NFL — seja para quem está começando ou já acompanha o esporte.
Hoje, o tema é Draft: o processo em que os 32 times da NFL escolhem novos jogadores que vêm da universidade.
O que é
O Draft da NFL é o principal mecanismo usado pelas franquias para renovar e reforçar seus elencos. O evento acontece anualmente, entre abril e maio, logo após o fim da temporada, e é dividido em sete rodadas. Em teoria, cada time tem uma escolha por rodada, mas trocas e compensações podem mudar esse número.
Diferente de outros esportes, o futebol americano não tem categorias de base. Os atletas só podem entrar na liga profissional depois de passarem pela universidade. Ou seja: nenhum jogador é formado dentro do próprio clube, como acontece no futebol. A única exceção são os programas internacionais de desenvolvimento, criados para descobrir talentos fora dos Estados Unidos e integrá-los ao sistema da NFL.
A ordem das escolhas
O Draft segue uma lógica simples: os times selecionam em ordem inversa à classificação da temporada anterior. O pior time tem a primeira escolha; o vencedor do Super Bowl, a última. Essa dinâmica é uma das formas que a NFL usa para manter o equilíbrio entre as franquias, dando prioridade a quem mais precisa se reforçar.
Na prática, é um sistema que evita que os mesmos times dominem a liga por muitos anos — o que ajuda a explicar por que tantas equipes conseguem se reinventar de uma temporada para outra.
Para os jogadores, no entanto, essa ordem representa um desafio. Ser escolhido no topo geralmente significa começar a carreira em um time em reconstrução, com elenco limitado e grande pressão por resultados. Os maiores talentos chegam como esperança imediata — e muitas vezes precisam render antes mesmo de estarem prontos.
Quem pode participar
Para estar elegível ao Draft, o atleta precisa ter concluído o ensino médio há pelo menos três anos. A maioria vem das grandes conferências do futebol universitário — como SEC, Big Ten e Pac-12 — onde o nível de competição é mais alto e a visibilidade, maior.
O principal evento de avaliação pré-Draft é o NFL Combine, realizado anualmente em Indianápolis desde 1987. Nele, cerca de 300 jogadores são convidados para uma bateria de testes físicos (como o famoso 40-yard dash), exames médicos detalhados e entrevistas com representantes das equipes. Os atletas também passam por avaliações psicológicas, medições corporais e drills técnicos específicos de posição.
O Combine, no entanto, é apenas parte do processo. Nos meses que antecedem o Draft, as equipes realizam uma avaliação completa de cada jogador. Isso inclui:
- Visitas presenciais às instalações das franquias;
- Entrevistas privadas com treinadores, general managers e psicólogos da equipe;
- Revisão do histórico médico, com foco em lesões anteriores e tempo de recuperação;
- Checagem de antecedentes disciplinares e acadêmicos, em busca de sinais de comprometimento ou possíveis problemas de conduta.
Essa preparação é intensa porque as franquias estão prestes a investir milhões de dólares — e, muitas vezes, o futuro da organização — em atletas de apenas 21 ou 22 anos.
Um exemplo claro foi o caso de Jalen Carter. Cotado para ser uma das três primeiras escolhas do Draft de 2023, o defensor viu seu nome cair após ser citado em um processo relacionado a um acidente de carro fatal, que envolveu um companheiro de time e uma funcionária da Universidade da Geórgia. Embora não tenha sido considerado culpado, Carter enfrentou questionamentos sobre sua ética de trabalho e maturidade. No fim, foi selecionado apenas na 9ª posição pelos Eagles.
No fim das contas, os times não escolhem apenas talento — escolhem pessoas em quem precisam confiar dentro e fora de campo. Por isso, o processo de avaliação é tão rigoroso.
A primeira rodada
A primeira rodada do Draft reúne as 32 primeiras escolhas — uma para cada franquia da NFL (salvo trocas). Por ser o momento mais esperado do evento, ela recebe tratamento especial: é transmitida separadamente, com ampla cobertura da mídia, torcedores presentes, câmeras nos bastidores e reações emocionadas dos jogadores ao receberem a ligação do time.
Atletas escolhidos nessa fase assinam contratos mais vantajosos, com bônus maiores e uma cláusula que permite à equipe estender o vínculo por mais um ano — totalizando até cinco temporadas de controle contratual. Essas escolhas são tratadas como ativos valiosos, tanto esportiva quanto financeiramente.
É também nessa rodada que os times priorizam posições estratégicas: aquelas que mais impactam o jogo e são mais difíceis de encontrar. Quarterbacks, offensive tackles, pass rushers e wide receivers dominam o topo do Draft. Um erro nessas escolhas pode custar anos de reconstrução — por isso, o foco é em talentos capazes de causar impacto imediato.
Por outro lado, posições como punter, kicker, fullback e long snapper raramente aparecem na primeira rodada. Elas são consideradas “commodities” — mais fáceis de repor, com menor variação de desempenho entre os melhores e os medianos. Por isso, os times costumam deixar essas seleções para as rodadas finais ou até mesmo buscar essas peças entre atletas não draftados.
Trocas entre times
As escolhas do Draft são uma moeda valiosa entre as franquias. Os times podem negociar posições antes ou durante o evento, em trocas que envolvem outras escolhas futuras e até jogadores já no elenco.
O motivo da troca depende da estratégia:
- Subir para garantir um talento específico;
- Descer para acumular mais escolhas e reforçar o elenco como um todo.
Essas movimentações são comuns, especialmente na primeira rodada, quando os general managers tomam decisões em tempo real conforme os jogadores vão sendo selecionados.
Um bom exemplo em 2025 foi o do Jacksonville Jaguars, que trocou com o Cleveland Browns para subir da 5ª para a 2ª posição — entregando ainda três outras escolhas de 2025 (2ª e 4ª rodadas) e uma primeira rodada de 2026. A subida foi para garantir Travis Hunter, vencedor do Heisman e talento raro, com capacidade para atuar tanto no ataque quanto na defesa.
Quando abrir mão da primeira rodada
Algumas franquias preferem trocar suas escolhas por jogadores já prontos, buscando resultados imediatos em vez de apostar em novatos. É uma estratégia arriscada — mas que pode valer a pena.
O exemplo mais conhecido é o do Los Angeles Rams, que ficou de 2017 a 2023 sem uma única escolha de primeira rodada. Durante esse período, o time investiu pesado em veteranos como Matthew Stafford, Jalen Ramsey e Von Miller. A aposta deu certo: o elenco experiente levou o time ao título do Super Bowl LVI, em 2022.
É uma aposta que compromete o futuro em troca de uma chance real de vencer no presente. E, no caso dos Rams, funcionou.
Jogadores não escolhidos
Nem todo talento entra na NFL pelo Draft. Quem não é selecionado nas sete rodadas vira um undrafted free agent (UDFA) — ou agente livre não draftado — e pode assinar com qualquer time da liga.
Apesar de começarem em desvantagem, muitos UDFAs conquistam espaço e até brilham. Um dos casos mais marcantes é o de Kurt Warner, não draftado em 1994. Depois de passar por ligas menores, ele conquistou o Super Bowl com o St. Louis Rams e foi eleito MVP da temporada e da final. Em 2017, entrou para o Hall da Fama.
Na NFL, nem sempre o caminho é direto — mas talento e perseverança abrem portas.
Não é uma ciência exata
Nem todo jovem talento vira sucesso na NFL. Brilhar no futebol universitário não garante que o jogador vai se adaptar ao ambiente profissional — com mais pressão, exigência física e responsabilidade.
Mesmo com dados, entrevistas e exames, o Draft está longe de ser infalível. No fim, os times avaliam atletas de 21 ou 22 anos e tentam prever como eles vão lidar com a rotina da liga.
O exemplo mais famoso é Tom Brady. Escolhido apenas na 199ª posição em 2000, ele se tornou o maior campeão da história da NFL, com sete títulos. Seis quarterbacks saíram antes dele — nenhum teve impacto parecido.
No sentido oposto, JaMarcus Russell foi a 1ª escolha geral em 2007. Tinha físico impressionante e braço potente, mas não conseguiu se adaptar. Sua carreira durou só três temporadas.
Esses casos mostram que o Draft é sempre uma aposta. Mesmo com toda a estrutura e análise, não existe fórmula garantida — e, muitas vezes, os times erram mais do que acertam.